segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Momento a dois

Lá estava ela. Estava me esperando. Percebi que, quando pus os pés na soleira da porta, ela deu um suspiro de alívio. Mas por um momento ainda pensei que aquele suspiro fosse sinal de nervosismo. Seria a primeira vez dela. Eu tinha que procurar entender, pois já havia passado por aquilo. Quando bati a porta atrás de mim, ela olhou fixamente nos meus olhos e sua respiração parecia estar um pouco mais acelerada. Senti vontade de rir. Não sei qual o motivo, mas quando presenciamos pessoas em situações de medo, de vergonha ou de constrangimento, achamos engraçado a maneira como elas reagem: não sabem como se acomodam num determinado lugar, começam a suar, o corpo começa a demonstrar que não agüenta mais e treme freneticamente. Ela estava mais ou menos assim. Não pensei duas vezes. Cheguei mais perto dela e ela abriu a boca. No intuito de acalmá-la, disse um “calma” da maneira mais agradável possível. Ela continuava com a boca aberta. Fiz o que tinha de ser feito. Quando me afastei, ela permanecia com a boca aberta, mas eu já tinha feito meu serviço. Acho que ela pensou que tinha mais. Mas eu estava com muita pressa, tinha outros compromissos e não queria continuar a vê-la tão nervosa, tão constrangida. Depois de termos feito o que tinha de ser feito há muito tempo, pois tanto eu como ela não agüentávamos mais adiar aquele momento, dei-lhe o papel-toalha que estava em cima da mesa para que ela limpasse sua delicada boca, a qual não seria mais a mesma depois daquele momento de tensão. Ela levantou-se meio tonta de onde estava, pegou outro pedaço de papel-toalha para cuspir um pouco mais e perguntou-me:
- Quando será a próxima consulta, doutor?
- Dia dezoito de março – eu disse enquanto fechava a porta atrás dela.